Livro | Os sete maridos de Evelyn Hugo (Taylor Jenkins Reid)

Comecei a leitura de Os sete maridos de Evelyn Hugo muito despretensiosamente. Percebi que existia uma certa comoção na internet por esse livro, mas eu não costumo me manter tão atualizada nos lançamentos, e nem me comover muito com o que fica hypado (é o medo de ter as expectativas frustradas). Como resultado, comecei a ler Evelyn Hugo depois de uma indicação (sem muitas explicações) de uma amiga. E fui surpreendida: a história é muuuuito boa. Tem bastante coisa que eu gostaria de comentar, mas acabaria trazendo spoilers e estragando a experiência, então vamo ver no que dá esse meu texto sem spoilers.

Eu fingindo ser uma estrela de cinema (foi o melhor que consegui fazer kkk)


O título me causou estranhamento porque é problemático ver mulheres reduzidas a seus relacionamentos amorosos como se isso fosse a coisa mais relevante de suas vidas. Mas logo compreendi a proposta: Fala-se dos sete maridos, mas a personagem principal é a Evelyn e todas as suas dimensões. Como um grande amigo da protagonista diz no livro, ela é impura, competitiva, dura na queda, vê o mundo do jeito que o mundo é, e parte para a briga para conseguir o que quer. Uma figura que foi fabricada para ser ingênua e sexy ao mesmo tempo como se fosse complexa demais para se preocupar com as ideias pouco complexas que as pessoas faziam dela.

Eu sei que o mundo prefere mulheres que não têm noção do próprio poder, mas estou de saco cheio disso.

Acompanhamos Monique, uma jornalista em busca de ascensão na carreira, que trabalha em uma revista onde é pouco valorizada. Ela está prestes a se divorciar do marido, e cresceu ferida pela morte repentina do pai que tanto amava. A atriz Evelyn Hugo insiste para que ela escreva a sua biografia. Você não entende a dimensão desse pedido. Evelyn é retratada como uma grande estrela do cinema que teve seu auge nas décadas de 1950 - 1960, teve diversos escândalos de sua vida expostos pela mídia, e uma vida amorosa bastante badalada (vide seus sete casamentos). Em contrapartida, hoje aposentada, ela se mostra bastante discreta com sua vida pessoal, não cedendo entrevistas nem aparecendo na mídia. Durante a história vemos o desabrochar de Monique enquanto ela entrevista Evelyn, e ficamos tão curiosos quando a jovem jornalista, querendo saber porque cargas d'água Evelyn insistiu tanto para que ela fosse a biógrafa.

Com o livro Monique pretende responder à pergunta: "Quem foi o grande amor da vida de Evelyn Hugo?". E aí você espera que esta seja uma história cheia de desilusões amorosas. E é. Mas também é muito mais que isso. Afinal como uma mulher poderosa num período tão escancaradamente machista e conservador, Evelyn precisou de muita astúcia e disposição para conseguir atingir seu grande objetivo: se tornar uma grande estrela. Falamos sobre racismo, sobre padrões de beleza, abuso de poder, objetificação da mulher, maternidade, LGBTQfobia... a lista é grande.

Vou abrir um parêntese para dizer que passei o livro todo imaginando Evelyn como Sofía Vergara, atriz colombiana belíssima e talentosíssima, com um corpo que se compara ao descrito para a personagem no livro. E talvez eu tenha sido influenciada por essa paródia que Modern Family fez da famosa fotografia de Sophie Loren e Jayne Mansfield, grandes atrizes da era de ouro de Hollywood, sendo Mansfield muito comparada a Marylin Monroe. 


Pesquisei bastante, primeiro para descobrir se Evelyn Hugo realmente existiu: veja bem, a personagem é tão bem construída, sua filmografia é tão bem descrita, que a autora quase me enganou. Dou um destaque para a construção da sexualidade de Evelyn que foi abordada de uma forma bastante sensível e necessária. Percebendo que Evelyn Hugo não existiu, e tendo eu um repertório tão pequeno quanto a referências do cinema das décadas de 1950 e 1960, parti para pesquisar e tentar encontrar as inspirações da autora para compor essa história maravilhosa. Por se tratar de uma história tão verossímil, deve haver muitas referências por trás. E acho que encontrei algumas. 

Primeiro, claramente houve uma inspiração na vida amorosa da diva Elizabeth Taylor. Se você já leu o livro, vai encontrar nesta matéria alguns fatos da vida de Taylor que soam bastante parecidos com os de Hugo, inclusive a quantidade de casamentos, que no caso da diva da vida real foram oito. E apesar de ter se casado apenas três vezes, a história de Marylin Monroe também é similar a de Evelyn, com seu primeiro casamento para fugir de sua antiga vida, todos os abusos do segundo marido alcoólatra, e todos os escândalos e especulações sobre a vida de Marilyn, que até hoje é tão misteriosa e cheia de teorias da conspiração. 

Assim como Hugo, Marilyn precisou fazer muitas modificações em sua aparência para se tornar a grande estrela de Hollywood. Dentre as mudanças está o cabelo loiro platinado, uma de suas marcas registradas.

No livro é muito falado sobre o domínio absurdo que os estúdios de cinema tinham sobre os atores. Por exemplo, a prática de casamentos arranjados, como descobri nessa matéria, parece ser algo bem comum daquela época. Isso diz sobre o quanto a imagem pública das celebridades é manipulada e maquiada para ser adequada aos padrões do público (principalmente no passado, mas sem dúvidas ainda há reflexos hoje em dia). É surreal ver as pessoas monetizando suas vidas pessoais dessa forma.

Tudo é maquiado para fazer os telespectadores sentirem que estão tendo acesso a um outro mundo, um mundo só para raros.

As atrizes sofriam (e sofrem) bastante por não se enquadrar aos padrões sejam eles estéticos ou de comportamento. Evelyn Hugo, mulher de descendência latino-americana sente a necessidade de tingir o cabelo de loiro e negar suas raízes para prosperar. Fez dietas absurdas para emagrecer, mesmo sendo magra, e se colocou à disposição das exigências dos estúdios para alcançar o estrelato. Katharine Hepburn, grande atriz da vida real, ganhadora de vários Oscars, não tem hoje tanto reconhecimento quanto a outra Hepburn: Audrey, eterna bonequinha de luxo (elas não são parentes, o sobrenome é só uma coincidência), já que a primeira atendia muito mais aos padrões de feminilidade adequados à época. 

Katherine Hepburn não se dobrava às pressões para manter uma postura mais "feminina" em sua vida pessoal. Sua vida sexual também era alvo de bastante especulação. Achei nesse link umas frases maravilhosas de Katherine, do tipo: "Se você segue todas as regras, você perde toda a diversão"


Já assisti alguns filmes clássicos que me fizeram perder o medo de ver filmes em preto e branco, e depois de ler Os sete maridos de Evelyn Hugo fiquei com vontade de voltar a esse mundo glamouroso do cinema antigo. É realmente notável o quanto essas mulheres tiveram que suportar para alcançar seus sonhos e objetivos, e o quanto, até hoje nós mulheres ainda sofremos muito com a pressão que vem da mídia.

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