Livro | Jantar secreto (Raphael Montes)

Olá! Eu até tenho lido com certa frequência ultimamente. Bem, tanto quanto a residência e a minha ansiedade permitem. E Jantar secreto foi a última ficção que eu li. Me impactou tanto, que precisei vir aqui conversar sobre. Nem que seja pra falar sozinha. 

Esse livro é do gênero que eu gosto de chamar de "gente jovem fazendo merda". E não é pouca merda não, tá? O que me incomoda é que cada vez que eu vejo o protagonista cavar a própria cova eu vejo que ele teria sim outra opção mais sensata. Mas, né, como já disse, o nome do gênero é "gente jovem fazendo merda", não precisa ter justificativa. 

Eu entrei na onda de ler esse livro por causa de uma discussão que vi no twitter, em que diziam que ele se inspirava no enigma da carne de gaivota. Eu lembrei que quando eu era criança fui apresentada a esse enigma e levei um tempão para descobrir a resposta (no fim meu tio se cansou da minha burrice e me contou). A história do enigma me chocou, mas ao contrário do que pensei, conhecer a resposta dele não me preparou nem um pouco para o que é narrado em Jantar secreto.

Jantar secreto conta a história de quatro amigos que saíram de uma cidadezinha do interior do Paraná para buscar o futuro no Rio de Janeiro. Para esses rapazes, voltar para Pingo D'agua, a cidadezinha de onde vieram, nunca pareceu uma opção. Nem mesmo quando tudo começa a dar errado e até a estadia no apêzinho alugado é ameaçada. 

O livro conta as frustrações desses jovens, e percebo que o autor faz um jogo com os nomes dos personagens (Dante, Leitão, Hugo e Miguel). Algo que talvez entregue um pouco o que o destino prepara para eles, ou isso é o que a gente (eu) acha no início da leitura. 

Dante é sonhador, quer montar a própria empresa. Ele é o protagonista da história. Ele é aquele cara que a gente torce pra ter uma gotinha de bom senso, mas sempre toma as decisões erradas. Sempre vai pelo caminho mais conveniente, e pede ao leitor que não o julgue, que em seu lugar nós faríamos o mesmo. Eu só penso: "Nós? Um abraço" (desculpa, gente, infelizmente eu sou fluente em memes). Dante é movido pela culpa.

Hugo quer ser reconhecido como o chef de cozinha genial que ele (acha que) é. Ele realmente parece ser bom, mas é um verdadeiro escroto. Hugo de move pela arrogância. Miguel só quer terminar a residência médica e... Ele realmente estava na residência, ou tava somente dando plantões? Não sei. Bom, esse personagem não é muito explorado, só é mostrado que apesar de não concordar com tudo ele não consegue se impor frente aos amigos, e tem uma mãe doente, que não tem plano de saúde, e ajudar a mãe justifica todas as atrocidades em que ele se mete. Ele vai chorando, desesperado, mas vai. Se move pela covardia.

E Leitão, bem, esse personagem me causou um incômodo desde o começo. Desde a escolha do nome até os comportamentos absurdos dele. É aquele velho estereótipo do gordo, preguiçoso, nerd, que só fica no quarto jogando vídeo game e comendo fast food o tempo todo. Mas é útil porque é um hacker que consegue invadir qualquer sistema. E também é o poço de onde vem algumas das melhores (piores) ideias. A história dele é razoavelmente bem explorada, e vejo o esforço do autor em justificar e amarrar direitinho suas ações, mas não sei se fico convencida. Não queria ser clichê, mas é isso, ele se move pela gula. E pela luxúria também, por que, não?

Tudo isso e nem falei de Cora, porque achei que já estava me alongando demais no texto. Mas na verdade eu não sei se gosto dela, da sua praticidade em lidar com situações extremas ou se desgosto da pouca profundidade da personagem. Ela é uma profissional do sexo que acaba se envolvendo com um dos rapazes e entra na empreitada deles de forma irreversível. Cora parece estar sempre em modo sobrevivência e ser capaz de tudo para se dar bem.

Por conta de dívidas que eles não tem como pagar, os quatro passam a organizar jantares secretos para a elite carioca. E daí vem várias críticas à hipocrisia da burguesia, bem como as desigualdades sociais, e o choque entre o mundo real e esse mundo paralelo em que as pessoas tem tanto dinheiro que precisam pagar pela experiência mais exclusiva possível pra demonstrar poder. Existe uma crítica a todo esse poder, e como ele pode ser utilizado para comprar lealdade e submissão. 

A história trata de forma sutil das pessoas invisíveis, e isso bate em mim porque no dia a dia eu lido com pessoas em situação de vulnerabilidade social que não são enxergadas pela sociedade. Também me pareceu uma crítica à indústria da carne que parece mesmo uma grande propaganda pró vegetarianismo (pelo menos foi assim que bateu aqui).

Não vou fazer suspense. Se você conhece o enigma da carne da gaivota sabe que estamos falando de canibalismo. E deixa eu te dizer... Esse livro é gore gore gore gore gore gore. Muito gore. Cenas fortíssimas que me fizeram gofar. E eu me odiei por ficar envolvida na história ao ponto de não conseguir parar de ler.

Terminei o livro com um gosto meio amargo na boca. É que eu não curto muito gore. Bom, como fã de terror eu tenho meus momentos, mas a forma como o tema é explorado me causou repulsa. E o objetivo é esse mesmo. É pra ser chocante: a violência é a estrela do show. 

___

Só uma observação: como é bom escrever algo além do meu TCC.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Livro | Os sete maridos de Evelyn Hugo (Taylor Jenkins Reid)

indo para a semana número sei lá quanto

Posso?