Livro | O Dilema do Porco-espinho (Leandro Karnal)

Esse livro é sobre solidão.

Há um tempinho conheci uma youtuber incrível, que é a Adriana Cecchi (a.k.a. Redatora de M#$%*). Ela faz muitas indicações de livros, filmes e séries que ela mesma chama de desgraçamentos mentais. Quando conheci o canal dela peguei a dica desse livro. Pouco tempo depois ele surgiu na lista de opções do clube do livro que eu faço parte. Pensei: pronto, é agora que leio esse desgraçamento.

Leandro Karnal tem uma escrita muito simpática e fluida, apesar de necessitar de umas pausas para assentar na mente algumas reflexões. Sinto como se ele estivesse conversando comigo. E nesse livro, especialmente, ele se torna de certa forma íntimo. Pois revela sua própria solidão, enquanto escritor, de encontro com a minha solidão de leitora.

Bom, para começar: Você está familiarizado com o dilema do porco-espinho? É uma metáfora proposto por Schopenhauer, filósofo alemão, sobre a convivência humana. No frio, porcos-espinho se unem, para que o calor de seus corpos os aqueça. Mas como calcular a distância entre a ideal entre o que é perto o suficiente para se aquecer, e o que é distante o bastante para não se machucar com os espinhos? Essa metáfora, analisando de forma breve, retrata a necessidade que o ser humano tem de se afastar, estar só, mas também de conviver socialmente. 

A visão que temos hoje da solidão como algo negativo tem raiz no "imperativo contemporâneo da felicidade", que, segundo Karnal vem da necessidade que temos de provar que somos felizes com nossas escolhas. E estar sozinho não parece (socialmente) uma escolha, mas uma falha. Se vivemos em um mundo de escolhas, onde podemos buscar nossa satisfação pessoal, falhar nessa realização é inadmissível. E se você decide não seguir os padrões da sociedade precisa mostrar que está feliz com isso.  

Mas solidão significa necessariamente algo ruim? Solidão é o mesmo que solitude?

Karnal traz diversos questionamentos como esse, para que você, sozinho ou não, pense a respeito, e responda com ele no decorrer da leitura. E para contribuir nessa construção ele busca filósofos, artistas e religiões, a fim de analisar a solidão em diversas perspectivas. E as referências são muitas. Sempre trazendo exemplos e ilustrando a discussão com várias obras de arte. O que é especialmente interessante se você considerar que a construção artística geralmente se dá em um momento de solidão/introspecção. Então estamos falando de obras sobre solidão produzidas em um momento de solidão/solitude. 

Automat (Edward Hopper): introspecção, solidão, vulnerabilidade...

Ausência 2 (Daniel Melim): Solidão a partir da ausência do outro

Então discutimos sobre a interação na era das redes sociais, que parecem ser a solução para o dilema do porco-espinho, pois permite afastamento e aproximação ao mesmo tempo. Ou será que a rede não proporciona um momento genuíno de solitude, e nem também proporciona uma interação social verdadeira? Fica aí a reflexão.

Assim partimos da era digital, falamos do isolamento dos eremitas e afins, da busca religiosa pelo "deserto", como algo físico, geográfico, mas também simbólico, de expiação, autoconhecimento e contato com o divino. Partimos para a representação da solidão no cinema, na literatura e nas artes plásticas, encaramos a solidão como punição, discutimos o "estar sozinho a dois" ou "no meio da multidão" e fechamos com a discussão de que somos seres sociais, tribais, comunitários, mas também temos a necessidade de conexão com o eu interior ou com o "outro eu". Equilíbrio é tudo, manas.

Além de toda a discussão sobre o estigma da solidão, e a história de como esse tema já foi encarado no passado, e como o vivenciamos atualmente, esse livro me trouxe muitas reflexões sobre meu momento atual. Me fez pensar na necessidade de resgatar alguns hábitos e voltar a me conectar comigo mesma.

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