Livro | A insustentável leveza do ser - Milan Kundera

Há tanto a ser dito sobre esse livro, que as ideias se embaralham e posso me perder no que é mesmo importante. 

Positivo e negativo. Várias coisas na vida tem esses dois pólos. Claro e escuro. Cheio e vazio. Mas enquanto ao peso e à leveza? Qual o pólo positivo e qual o negativo nessa equação? Essa discussão vai sendo suscitada à medida que vemos como os quatro personagens principais carregam seus fardos ou lidam com ausências.

Não vou mentir: eu estava detestando o livro no início. O texto me parecia muito corrido, com poucos detalhes. O ritmo era estranho, e eu não enxergava a profundidade. O ponto de vista de Tomas justificando suas escrotices, e descrevendo sua mulher amada como um ser imaculado era o que menos me interessava. Simplesmente insisti e sobrevivi à primeira parte. Mas depois quando os demais personagens passaram a ter suas personalidades aprofundadas eu comecei a gostar.

Este quadro de Gustave Caillebotte (Homem jovem à janela) é como imagino Tomas em sua primeira aparição no livro. 

A partir das conexões entre as vidas de Tomas, Tereza, Sabine e Franz vamos discutindo o que é o amor, o que leva as pessoas a serem como são, o quanto o passado pesa sobre o que construímos como self e até onde podemos abrir mão de algo nosso para ser "feliz" com alguém. A partir das conexões entre as vidas de Tereza, Sabine, Franz e Tomas discutimos sobre a dualidade corpo e alma, sobre como a mulher pode enxergar a si mesma como suja e pouco merecedora do que tem. Como mulheres podem se admirar e ser rivais ao mesmo tempo. Opressão.

A partir das conexões entre as vidas de Sabine, Franz, Tomas e Tereza vemos o mundo de aparências e como algumas pessoas sentem necessidade de desempenhar o papel que a sociedade espera que desempenhem, enquanto outras preferem viver na traição: traindo aos outros, traindo a pátria, traindo os ideais da sociedade. Traindo o que a oprime, e sendo fiel apenas a si própria. 

E tudo isso ocorrendo em uma época de violência e censura. Vale a pena citar que a história se passa na Tchecoslováquia a partir de 1968, o ano da invasão russa e a Primavera de Praga. Em meio a esse ambiante pesado, os personagens buscam a leveza em suas trajetórias.

Assim comecei a me conectar com o texto. Toda a poesia e melancolia, apesar de achar bizarras algumas interpretações que o autor (homem) faz sobre a alma feminina e o que significa ser mulher. São infinitas discussões. O livro proporciona infinitas possibilidades. E é incrível por conta disso.

O autor quebra a terceira parede. Nos conta como os personagens foram criados, e como eles interagem com o próprio autor. Ele nos justifica os atos, explica mastigadinho como só um criador poderia falar sobre sua criatura.

A doce leveza do ser é apenas ser, sem todo o esforço de se enquadrar em algo. Apenas viver. Por um momento não precisar se preocupar com as próprias regras ou regras impostas. A insustentável leveza de ser é trair todas as expectativas e fazer o que dá na vontade. Liberdade. E arcar com o que isso acarreta depois.

A insustentável leveza do ser é viver fora dos holofotes, pois é quando ninguém está olhando que conseguimos demonstrar quem realmente somos, sem encenar. Citando Bethoven, recorrentemente citado no livro, essa leveza é um ess muss sein: tem de ser. Apenas ser.

Essa liberdade tem seu preço.

Então volto a perguntar: a leveza é positiva ou negativa? 

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